Da Investigação à Prática: Pós-Luxação do Cotovelo

6 - minutos de leitura Publicado em Uncategorized
Escrito por Ashish Dev Gera info

São sempre os “guerreiros de fim de semana” que ficam connosco mais tempo. A Tara era uma designer gráfica de 32 anos com uma paixão discreta pelo bouldering. Durante a semana, desenhava logótipos. Ao fim de semana, escalava paredes.

Até que uma queda mudou tudo.

Durante uma escalada informal num ginásio, caiu de forma desajeitada, aterrando com o braço direito estendido. O resultado? Uma luxação posterior do cotovelo.

Ela reduziu a luxação no próprio local, tendo sido posteriormente imobilizada e encaminhada para mim duas semanas depois com a prescrição habitual: “retorno gradual à atividade, recuperar a amplitude de movimento, evitar instabilidade.”

Mas quando a Tara entrou na clínica, não estava apenas preocupada com a rigidez. Ela tinha medo de nunca mais conseguir escalar.

 

Avaliação subjetiva: mais do que apenas dor

A Tara relatou dor ligeira, sobretudo na extensão máxima do cotovelo, mas a sua verdadeira preocupação era a sensação de vulnerabilidade que sentia na articulação. Havia hesitação na sua voz quando falava em voltar a escalar. Nem sequer tinha tentado abrir uma porta com esse braço.

Objetivos? “Só quero voltar a escalar. Mas não sei se confio no meu cotovelo.”

Sinais de alerta foram excluídos: sem sintomas neurológicos, sem comprometimento vascular. A imobilização durou menos de três semanas, o que era tranquilizador. Não tinha antecedentes de problemas no cotovelo. Mas os sinais de alerta psicossociais destacavam-se: baixa autoeficácia, medo de nova lesão, incerteza quanto ao regresso à prática desportiva.

 

Avaliação objetiva: rigidez, mas também dúvidas

A Tara apresentava uma limitação de cerca de 25 graus na extensão e alguma rigidez na flexão. A pronação e supinação estavam quase completas, mas com sensação de rigidez. Não havia sinais de instabilidade grosseira nem apreensão durante cargas em amplitudes médias, mas evitava claramente as posições terminais.

A força estava ligeiramente reduzida de forma global, especialmente na preensão e nos flexores/extensores do cotovelo. O que mais se destacava não era a fraqueza em si, mas o comportamento de proteção: compensava constantemente com o braço esquerdo.

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Orientar o tratamento: deixar a investigação liderar o caminho

Duas Revisões de Pesquisa recentes da Physio Network influenciaram fortemente a minha abordagem.

A primeira Revisão, da Dr.ª Val Jones, explorou as barreiras psicológicas em escaladores após uma luxação do cotovelo. Constatou que 10% dos escaladores desistiram por completo da prática, sendo a redução da autoeficácia um dos principais preditores da fraca recuperação funcional. A Tara não era apenas uma paciente com uma luxação do cotovelo — era um exemplo claro de evitamento por medo. Abordar isso desde o primeiro dia era tão importante quanto recuperar a extensão.

A segunda revisão foi reveladora: analisava um estudo cadavérico que demonstrava que o movimento ativo do cotovelo acima da cabeça simulava uma cinemática quase normal, mesmo com lesões nos ligamentos colaterais medial e lateral. Isto desafiou a minha apreensão inicial. Tradicionalmente, os clínicos preocupam-se com a atividade acima da cabeça após uma luxação. Mas este estudo apoiava o movimento precoce em planos elevados, desde que carregado de forma sensata.

 

Plano de reabilitação: investigação em prática

Fase inicial (semanas 2–4)

O nosso primeiro objetivo: tranquilizar e promover movimento ativo. Eliminámos os alongamentos passivos prolongados e optámos por movimento ativo controlado (AROM- Active Range of Motion) em vários planos, incluindo posições acima da cabeça com roldanas e deslizamentos na parede.

Expliquei à Tara que os movimentos acima da cabeça não eram perigosos — eram naturais e até benéficos, especialmente para a congruência articular e confiança. Esta mudança de perspetiva refletiu-se até na sua postura.

Iniciámos também isométricos ligeiros para flexores e extensores, e incluímos trabalho de preensão. Mas o nosso maior progresso nesta fase? Definir uma hierarquia de exposição gradual: abrir um frasco, puxar uma porta, levantar uma mochila.

Fase intermédia (semanas 4–8)

Com a amplitude de movimento quase totalmente recuperada por volta da semana 5, passámos a focar-nos na força e na estabilidade dinâmica. Com base na segunda Revisão de Pesquisa, incorporei trabalho com bandas elásticas acima da cabeça (pense: diagonais, transportes com kettlebell) e carga dinâmica em apoio de quatro apoios. Introduzimos também exercícios pliométricos ligeiros: lançamentos de bola, receção reativa e tarefas de toques rápidos. Estes exercícios não eram apenas sobre força – tratavam-se de ensinar a Tara a voltar a confiar no cotovelo.

E voltávamos sempre à carga psicológica. Todas as semanas refletíamos: O que foi mais difícil? O que foi mais fácil? Como respondeu o cotovelo após cada sessão? Este registo subjetivo deu à Tara um verdadeiro sentido de participação no processo.

Fase final (Semanas 8–12+)

A escalada era o nosso ponto de orientação, por isso adaptámos os testes de regresso ao desporto tendo isso em conta. Suspensões com um só braço (com carga progressiva), remadas em TRX e tarefas de alcance na parede ajudaram a simular as exigências do boulder.

Não tivemos pressa. Na verdade, treinámos a gestão do fracasso: o que faria ela se escorregasse ou tivesse de cair subitamente? Planear a possibilidade de recaída deu-lhe confiança.

A Tara fez a sua primeira escalada parcial na parede na semana 10 e percursos completos (grau fácil) na semana 12. À semana 14, já estava de volta ao grau de escalada que tinha antes da lesão.

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Conclusão

Nunca se tratou apenas de um cotovelo. As luxações do cotovelo podem parecer um problema mecânico, mas a recuperação é profundamente psicológica. O caso da Tara lembrou-me que nenhum exercício de mobilidade substitui a reconstrução da autoconfiança.

As Revisões de Pesquisa deram-me luz verde para sobrecarregar o ombro acima da cabeça desde cedo e ajudaram-me a identificar a barreira invisível: o medo de voltar a lesionar-se. Os clínicos costumam procurar instabilidade nas articulações. Mas, por vezes, é a instabilidade na identidade que precisamos de vigiar.

Por isso, da próxima vez que um escalador entrar na sua clínica após uma luxação, trate o cotovelo – claro. Mas trate também o medo.

Porque, por vezes, o melhor resultado não é apenas recuperar o movimento. É encontrar o caminho de volta à parede, um ponto de apoio de cada vez.

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