Reabilitação de Lesão nos Gémeos (Calf Strain Rehab): da Pesquisa à Prática

11 - minutos de leitura Publicado em Perna
Escrito por Ashish Dev Gera info

Já teve a sensação de que os seus gémeos saíram do seu controlo, fazendo com que começasse a mancar e a perguntar-se o que terá acontecido? Quando se trata de lesões musculares nos membros inferiores, as distensões dos gémeos ficam habitualmente em segundo plano, quando comparadas com as lesões dos isquiotibiais e do quadríceps.
No entanto, as lesões nos gémeos são muito comuns em diversos desportos, particularmente em corridas e desportos com bola, mas muitas vezes não recebem a devida atenção no que diz respeito à compreensão e tratamento. É crucial compreender a importância de uma reabilitação adequada para permitir que os atletas retornem com segurança ao desporto (e permaneçam lá!). Os atletas e fisioterapeutas devem estar cientes dos sinais e sintomas de lesões nos gémeos, bem como da importância de se manterem atualizados relativamente às pesquisas para uma reabilitação eficaz. Ao destacar esse aspeto, muitas vezes negligenciado das lesões desportivas, podemos capacitar melhor as pessoas para a prevenção, controlo e recuperação com sucesso de distensões nos gémeos.

Então, prepare-se para desvendar o mistério, porque vamos explorar o mundo das lesões nos gémeos! Como a pesquisa ajuda a eliminar estes dolorosos contratempos? Vamos descobrir juntos! Neste blog, vou destacar como as análises de Pesquisas da Physio Network ajudaram a reabilitar o meu corredor com sucesso para que pudesse voltar ao desporto.

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O caso

O paciente, Sr. J.D., é um homem de 28 anos, um corredor entusiasta que se está a preparar para uma maratona. Apresentou-se com queixa de dor aguda no seu gémeo direito durante uma sessão de treino intervalado. Descreveu um início súbito de dor durante um sprint, acompanhado por uma sensação de estalo na perna. Sem histórico de traumatismo direto ou lesões anteriores na perna refere, no entanto, durante o último mês, dor e um aumento progressivo da tensão nos músculos da perna após a corrida. Também mencionou um aumento recente na intensidade do treino antes do incidente. Há histórico de uma entorse do tornozelo direito há um ano, enquanto jogava basquetebol. O Sr. J.D. relatou dificuldade em suportar peso na perna afetada e expressou preocupações sobre a sua capacidade de participar na próxima maratona. Foi realizado um historial subjetivo, detalhado, para compreender as cargas de treino, os fatores de estilo de vida e a perceção do paciente.

Durante a avaliação, o Sr. J.D. apresentou sensibilidade, descoloração e edema na perna direita, no músculo gastrocnémio. A flexão plantar ativa e a dorsiflexão do tornozelo provocaram dor, particularmente durante a flexão plantar com resistência. Foi observada uma diminuição notável da força durante o impulso, e o Sr. J.D. coxeava durante a marcha. Não foi detetado nenhum defeito palpável no gémeo da perna direita. A Amplitude de Movimento Activo (Right Active Range of Motion (AROM)) do tornozelo direito era menor em comparação com o esquerdo, e a Amplitude de Movimento Passivo (Passive Range Of Motion (PROM)) também estava limitada. A Ressonância Magnética (RM) não foi realizada, pois o paciente optou por não a fazer, ficando satisfeito com a avaliação e o diagnóstico realizados.

O processo de diagnóstico foi facilitado por esta brilhante Revisão de Tom Goom para a Physio Network. Dado o mecanismo da lesão e os resultados clínicos, uma distensão muscular na perna envolvendo o músculo gastrocnémio, era a principal hipótese de diagnóstico diferencial. A rotura do tendão de Aquiles foi descartada devido à força intacta da flexão plantar do tornozelo e ao teste de Thompson negativo. Condições neurológicas e síndromes de aprisionamento foram igualmente afastadas. Sinais de alerta, incluindo Trombose Venosa Profunda (Deep Vein Thrombosis (DVT), condições de claudicação ou sarcoma ósseo, foram também excluídos.

O principal instrumento de avaliação para monitorizar o progresso do Sr. J.D. foi a Escala Visual Analógica (Visual Analog Scale (VAS)) para a dor, que avalia a gravidade da dor sentida durante atividades funcionais, como andar, correr e saltar. Além disso, a Escala de Função de Extremidade Inferior (Lower Extremity Functional Scale (LEFS)) foi utilizada para avaliar as limitações funcionais do Sr. J.D. e monitorizar as alterações na sua capacidade de realizar atividades diárias e tarefas relacionadas com o desporto.

Para avaliar o sofrimento psicológico e a frustração causadas pela interrupção repentina do seu plano de treino e do calendário de competição, foi utilizada a escala de Tampa para a cinesiofobia. Abordar as preocupações do paciente sobre o impacto da lesão no seu desempenho e objetivos de corrida foi uma abordagem crucial para manter a motivação e a adesão ao programa de reabilitação.

 

Avaliação da capacidade e prognóstico

Para avaliar a capacidade de suporte de carga dos músculos da perna, foi realizado o teste de elevação do calcanhar em pé assim que o doente conseguiu realizá-lo (uma semana após a consulta inicial). Conseguiu realizar 34 repetições com boa técnica no lado não afetado e 23 repetições no lado direito. Iniciou-se o plano de reabilitação e estimou-se um prazo de 6 a 12 semanas para o regresso à corrida.

Reabilitação e regresso à atividade

A Revisão de Tom Goom define as bases para uma reabilitação bem-sucedida e otimizada ao descrever seis fases no processo:

1- Fase inicial de carga

A fase inicial de carga teve como objetivo reduzir a irritação e a dor iniciais, mas sem repouso completo. Exercícios isométricos foram usados dentro de uma amplitude de movimento limitado, com repetições e carga reduzida. A aplicação de fita adesiva foi utilizada como complemento, e um auxiliar de marcha foi prescrito para evitar carga excessiva nesta fase inicial.

2- Fase de fortalecimento com carga

Após a primeira semana, o fortalecimento foi progredindo, aumentando a amplitude do movimento, com foco principal no músculo sóleo. A Revisão de Tom deu confiança ao raciocínio clínico por trás da carga precoce do gémeo, estabelecendo a base para uma reabilitação bem-sucedida. Evitou a perda de condicionamento muscular e ajudou a combater o receio da dor. À medida que a dor diminuía iniciou-se o treino de carga através da amplitude e direção do movimento. Alguns exercícios e variações utilizados nesta fase foram: elevação de calcanhar com ambas as pernas (3 séries de 12 repetições), progredindo para elevação de uma perna só (3 séries de 12 repetições), agachamentos contra a parede com elevação do calcanhar (3 séries de 20 segundos) e caminhada na ponta dos pés (3 séries de 15 segundos). A progressão destes exercícios envolveu o aumento da carga, manipulação do ritmo, adaptação da amplitude de movimento e transição para o trabalho unilateral. O paciente cumpriu com os exercícios em casa e compareceu regularmente às sessões de fisioterapia, inicialmente duas vezes por semana durante a fase mais dolorosa, e três vezes por semana nas fases seguintes.

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3- Fase de pliometria

Conforme descrito na Revisão de Tom, exercícios pliométricos foram adicionados ao programa na forma de saltos tipo pogo (3×15 segundos, progredindo para 3 série de 1min sem dor) e saltos para a frente com ambas as pernas, progredindo para saltos com uma perna só (3 séries de 8 repetições). O paciente estava familiarizado com a corda de saltar, e foram realizados dois minutos de saltos sem dor.

4- Fase de preparação para a corrida

Para preparar o paciente para as exigências da corrida, foram adicionados exercícios como a caminhada rápida, escadas e lunges, sempre monitorizando os sintomas e avaliando o seu progresso. A progressão dos exercícios de fortalecimento continuou com o aumento de carga e a introdução de treino de resistência pesada e lenta para melhorar a resistência e a capacidade do músculo da perna. O programa de fortalecimento do músculo da perna do paciente incluía elevações excêntricas de gémeos com ambas as pernas numa plataforma, com pesos (1,5x o peso corporal; 4 séries de 8 repetições), elevações de gémeos de dupla perna com transição para uma perna (1,5x o peso corporal; 4 séries de 20 segundos de sustentação), caminhada na ponta dos pés com pesos, e exercícios pliométricos mais desafiadores para desenvolver mais potência.

A reavaliação da capacidade de suporte de carga da musculatura do gémeo foi realizada por meio de elevações do calcanhar em pé, com uma perna só, sem dor, usando pesos equivalentes a 0,4 vezes o peso corporal do paciente, para 3 séries de 10 repetições.

5- Fase de regresso à corrida

De acordo com a Revisão de Tom Goom, a resposta do paciente ao treino específico para corrida foi observada e a exposição ao treino foi implementada de acordo com a sua reação. Esta fase também incluiu uma discussão aprofundada e educação do paciente sobre todos os riscos envolvidos no regresso à corrida demasiado cedo. O prognóstico foi dado de acordo com a gravidade da lesão, e foram definidos prazos realistas. A fase de regresso à corrida começou apenas após a ausência de reações adversas a qualquer uma das atividades anteriores; por exemplo, saltos com uma perna só sem dor e sem aumento da sensação de tensão nos músculos da perna. Inicialmente, durante as primeiras três semanas, um programa de caminhada/corrida foi implementado, reduzindo gradualmente o tempo de caminhada e eliminando-o por completo até à semana dez. Assim que o paciente conseguiu correr sem dor de forma contínua, o foco passou a ser o aumento de distância e a capacidade em introduzir treino de velocidade e corridas em declive.

6- Monitorização do atleta

Ao final da semana 12, o paciente recebeu alta do tratamento com um programa de fortalecimento progressivo direcionado aos membros inferiores e um programa de corrida para aumentar gradualmente a carga de treino e prevenir recorrências. Devido à elevada taxa de recorrência de distensões musculares nas pernas, recomenda-se que o paciente seja monitorizado, por pelo menos dois meses, após o regresso à atividade. O programa de corrida fornecido ao paciente incluía a monitorização semanal da dor através da Escala Visual Analógica (Visual Analog Scale (VAS)) e da sensação de tensão ao final de cada semana, incluindo regras para adaptar o programa de corrida e orientação para consultar o fisioterapeuta conforme a necessidade.

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Prevenção de lesões

Esta Revisão do Dr. Teddy Willsey, destaca a importância do mecanismo e histórico da lesão para os profissionais conseguirem determinar com maior precisão, após uma distensão muscular nos gémeos, o tempo estimado de regresso à atividade. De acordo com a revisão, uma anamnese detalhada do paciente é fundamental para determinar a gravidade da lesão, definir o plano de fortalecimento muscular e, consequentemente, traçar o programa de regresso à corrida.
Como aponta Shruti Nambiar na sua Revisão, apesar da pouca literatura disponível sobre os métodos eficazes para prevenir recorrências de distensões musculares na perna, os exercícios de fortalecimento para a musculatura da perna têm, no entanto, mostrado resultados promissores nessa área.

 

Concluindo

No campo da reabilitação de distensões musculares na perna, o sucesso não se resume apenas a seguir um protocolo genérico — trata-se de criar uma jornada personalizada, adaptada às necessidades e objetivos individuais do paciente. Ao priorizar avaliações meticulosas, implementar precocemente exercícios de fortalecimento e adotar uma abordagem progressiva focada em amplitude de movimento, força, controlo e potência, pavimentamos o caminho para um regresso firme à atividade desportiva. É importante recordar que não é apenas sobre voltar ao treino; mas sobre permanecer apto a fazê-lo. A educação do paciente, o estabelecimento de prazos realistas e o alinhamento de expetativas são as nossas diretrizes nesta jornada. E ao navegar por estas águas, as ideias obtidas das Revisões de Pesquisa da Physio Network têm sido minha estrela polar.

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